"eu vou mostrando como sou e vou sendo como posso..." como diriam os Novos Baianos
quarta-feira, abril 27, 2011
quinta-feira, abril 21, 2011
The Place
The place may be clean and tidy
and have for furniture only a mat
if there are windows if they are large
so much the better if there’s a flower
or a picture that’s special
if there is a teacher
there may be respite from sorrow
if there is rain remember the occasion
of the double rainbow if there is a marriage
there may be need of a goat
about beauty the old ones could not have forseen
if there is love
think on these things honey nuts and olives
if they are taken from nature
there will be nothing to behold
nor an eye
a poet will have to sing
of the ineffable as true
to begin with
From A Palace of Pearls (Copper Canyon Press, 2005), by Jane Miller.
Pic by rwangsa
quinta-feira, abril 14, 2011
domingo, abril 10, 2011
Tu que me deste o teu cuidado
TU QUE ME DESTE O TEU CUIDADO...
Tu que me deste o teu carinho
E que me deste o teu cuidado,
Acolhe ao peito, como o ninho
Acolhe ao pássaro cansado,
O meu desejo incontentado.
Há longos anos ele arqueja
Em aflitiva escuridão.
Sê compassiva e benfazeja.
Dá-lhe o melhor que ele deseja:
Teu grave e meigo coração.
Sê compassiva. Se algum dia
Te vier do pobre agravo e mágoa,
Atende à sua dor sombria:
Perdoa o mal que desvaria
E traz os olhos rasos de água.
Não te retires ofendida.
Pensa que nesse grito vem
O mal de toda a sua vida:
Ternura inquieta e malferida
Que, antes, não dei nunca a ninguém.
E foi melhor nunca ter dado:
Em te pungido algum espinho,
Cinge-a ao teu peito angustiado.
E sentirás o meu carinho.
E setirás o meu cuidado.
Manuel Bandeira
sábado, abril 09, 2011
Laisser faire, laisser passer
1.
o neoliberal
neolibera:
de tanto neoliberar
o neoliberal
neolibera-se de neoliberar
tudo aquilo que não seja neo (leo)
libérrimo:
o livre quinhão do leão
neolibera a corvéia da ovelha
2.
o neoliberal
neolibera
o que neoliberar
para os não-neoliberados:
o labéu?
o libelo?
a libré do lacaio?
a argola do galé?
o ventre-livre?
a bóia-rala?
o prato raso?
a comunhão do atraso?
a ex-comunhão dos ex-clusos?
o amanhã sem fé?
o café requentado?
a queda em parafuso?
o pé de chinelo?
o pé no chão?
o bicho de pé?
a ração da ralé?
3.
no céu neon
do neoliberal
anjos-yuppies
bochechas cor-de-bife
privatizam
a rosácea do paraíso
de dante
enquanto lancham
fast-food
e super
(visionários) visam
com olho magnânimo
as bandas
(flutuantes)
do câmbio:
enquanto o não
- neoliberado
come pão
com salame
(quando come)
ele dorme
sonhando
com torneiras de ouro
e a hidrobanheira cor
de âmbar
de sua neo-
mansão em miami
4.
o centro e a direita
(des)conversam
sobre o social
(questão de polícia):
o desemprego um mal
conjuntural
(conjetural)
pois no céu da estatís-
tica o futuro
se decide pela lei
dos grandes números
5.
o neoliberal
sonha um mundo higiênico:
um ecúmeno de ecônomos
de economistas e atuários
de jogadores na bolsa
de gerentes
de supermercado
de capitães de indústria
e latifundários de
banqueiros
- banquiplenos ou
banquirrotos
(que importa?
dede que circule
autoregulante
o necessário
plusvalioso
numerário)
um mundo executivo
de mega-empresários
duros e puros
mós sem dó
mais atento ao lucro
que ao salário
solitários (no câncer)
antes que solidários:
um mundo onde deus
não jogue dados
e onde tudo dure para sempre
e sempremente nada mude
um confortável
estável
confiável
mundo contábil.
6.
(a
contramundo o mundo-não -mundo cão-
dos deserdados:
o anti-higiênico
gueto dos
sem-saída
dos excluídos pelo
deus-sistema
cana esmagada
pela moenda
pela roda dentada
dos enjeitados:
um mundo-pêsames
de pequenos
cidadãos-menos
de gente-gado
de civis
sub-servis
de povo-ônus
que não tem lugar marcado
no campo do possível
da economia de mercado
(onde mercúrio serve ao deus
mamonas)
7.
o neoliberal
sonha um admirável
mundo fixo
de argentários e multinacionais
terratenentes terrapotentes
coronéis políticos
milenaristas (cooptados) do
perpétuo
status quo:
um mundo privé
palácio de cristal
à prova de balas:
bunker blau
durando para sempre - festa
estática
(ainda que sustente sobre fictas
palafitas
e estas sobre uma lata
de lixo)
Haroldo de Campos
Fragmentos
1
Me quer ? Não me quer ? As mãos torcidas
os dedos
despedaçados um a um extraio
assim tira a sorte enquanto
no ar de maio
caem as pétalas das margaridas
Que a tesoura e a navalha revelem as cãs e
que a prata dos anos tinja seu perdão
penso
e espero que eu jamais alcance
a impudente idade do bom senso
2
Passa da uma
você deve estar na cama
Você talvez
sinta o mesmo no seu quarto
Não tenho pressa
Para que acordar-te
com o
relâmpago
de mais um telegrama
3
O mar se vai
o mar de sono se esvai
Como se diz: o caso está enterrado
a canoa do amor se quebrou no quotidiano
Estamos quites
Inútil o apanhado
da mútua dor mútua quota de dano
4
Passa de uma você deve estar na cama
À noite a Via Láctea é um Oka de prata
Não tenho pressa para que acordar-te
com relâmpago de mais um telegrama
como se diz o caso está enterrado
a canoa do amor se quebrou no quotidiano
Estamos quites inútil o apanhado
da mútua do mútua quota de dano
Vê como tudo agora emudeceu
Que tributo de estrelas a noite impôs ao céu
em horas como esta eu me ergo e converso
com os séculos a história do universo
5
Sei o puldo das palavras a sirene das palavras
Não as que se aplaudem do alto dos teatros
Mas as que arrancam caixões da treva
e os põem a caminhar quadrúpedes de cedro
Às vezes as relegam inauditas inéditas
Mas a palavra galopa com a cilha tensa
ressoa os séculos e os trens rastejam
para lamber as mãos calosas da poesia
Sei o pulso das palavras parecem fumaça
Pétalas caídas sob o calcanhar da dança
Mas o homem com lábios alma carcaça.
Não as que se aplaudem do alto dos teatros
Mas as que arrancam caixões da treva
e os põem a caminhar quadrúpedes de cedro
Às vezes as relegam inauditas inéditas
Mas a palavra galopa com a cilha tensa
ressoa os séculos e os trens rastejam
para lamber as mãos calosas da poesia
Sei o pulso das palavras parecem fumaça
Pétalas caídas sob o calcanhar da dança
Mas o homem com lábios alma carcaça.
Vladimir Maiakóvski
tradução de Augusto Campos
Reportagem
Aborrecido, passeio Pelas ruas da cidade. Deixei agora o Rossio E atravesso o Borratém. Deu meia-noite pausada No Carmo. Um amigo meu Passa e tira-me o chapéu. Paro a uma esquina. Esmoreço Numa saudade que surge Dentro de mim não sei como: Uma saudade infinita, Misto de choro e revolta. Alguém me chama no escuro: Volto a cabeça. A uma porta Um vulto mexe. - Sou eu!, Não fuja, sou eu... - Mas quem? Retrocedo, não conheço A mulher que me chamou. Na verdade ninguém ouve, Ninguém distingue o apelo Do amor que anda perdido No mistério de mentir: Deixo-a ficar onde estava; Dou-lhe um cigarro e um sorriso Dizendo que vou dormir. Atira-me boa-noite Num frio olhar de ofendida. Meto à rua do Amparo A perguntar se esta vida Não terá finalidade Menos sórdida e banal? Atafonas. Uma Igreja. Mais acima o Hospital. Um marinheiro propõe A esta que atravessou A rua do Benformoso Irem tomar qualquer coisa Na Leitaria da Guia. Ela pára. É uma catraia Que talvez não tenha ainda Dezasseis anos. Bonita. Devagar vou-me chegando Xaile, uma blusa, uma saia... E oiço a fala dos dois. Ele parece uma onda, Impetuoso, alagante. Ela é um breve bandó Num corpito provocante. E seguem... Ele, encostado, Muito encostado e aquecido Lá vai como se encontrasse Um objecto perdido Que foi milagre encontrá-lo... Cortaram além!... E param? Oiço o rebate de um estalo E um grito subtil de prece Amedrontada na fuga... Desço ao Marquês do Alegrete. Um candeeiro sinistro Numa casa que se aluga... Vejo um polícia. Arrefece. Um grupo de três sujeitos Discute o vinho de Torres. Varrem as ruas. Um gato Bebe água numa sarjeta; Uma carroça parou Carregada de hortaliça Junto à Praça da Figueira. Corto a rua dos Fanqueiros Já um pouco estropiado... Acendo um cigarro. A noite Lembra um fantasma assustado... Chego ao Terreiro do Paço. O arco da rua Augusta Parece mais imponente Na minha desolação... Vou até ao cais. Em baixo O rio bate sem reacção... A maré vasa. No céu, Vão-se apagando as estrelas. Um guarda-fiscal dormita Na guarita, mas de pé. Um velhote com um cesto E uma lata vem dizer-me Se eu quero beber café. Num banco de pedra. Cismo. E ali me fico a cismar Em coisa nenhuma... O dia Principia a querer ser Mais um passo na incerteza Das nossas aspirações... As águas do rio a escutar Parecem adormecidas... E o dia nasce! Vem triste, Nublado, fosco, cinzento, Enquanto pela cidade A vida acorda e desata O matinal movimento... António Botto Photo by Gatumudo |
sexta-feira, abril 08, 2011
The Lovers
One is upstairs typing,
the other downstairs
the other downstairs
reading, two lovers
separated by a single floor.
A simple sentence.
A simple sentence.
The closest they will get
is in that moment
when one stops the way
when one stops the way
the other also stops,
exchanging places
with each other
with each other
without ever getting up—
Timothy Liu is the author of eight books of poems, most recently Polytheogamy and Bending the Mind Around the Dream’s Blown Fuse.
in Zócalo Public Square
photo by aless&ro
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